23.8.07

Discurso de paraninfo - formatura da Biblioteconomia, UFMG, em 24/08/2007.

Caros colegas componentes da mesa, caros alunos, familiares, amigos,

Hoje é um dia de festa e de celebração. A formatura na graduação é um rito de passagem como poucos na vida. Há um misto de felicidade e apreensão, porque neste momento, vocês se sentem como se tivessem deixado um porto seguro e se lançam a um mar desconhecido. Terminou a última fase da vida em que eram “dirigidos”... Seja pelo desejo dos pais ou responsáveis, seja por um programa acadêmico. Mesmo que venham a ter muitos “chefes”, ao invés de professores, a partir de agora terão – cada vez mais – responsabilidade individual pelos caminhos e decisões tomadas. Guimarães Rosa dizia com propriedade que “a colheita é comum, mas o capinar é sozinho”.

Muito mais do que um aniversário, a formatura é um momento em que se confere um “estatuto de maturidade enrolada em um canudo”, ou, como dizia Renato Russo, um passaporte para “Ter carro do ano, TV a cores, pagar imposto, ter pistolão. Ter filho na escola, férias na Europa, conta bancária, comprar feijão. Ser responsável, cristão convicto, cidadão modelo, burguês padrão... você tem que passar no vestibular”. Vocês hoje sabem que passar no vestibular era a parte fácil da história.

Eu peço licença e ao mesmo tempo desculpas pelo tom não ortodoxo e excessivamente pessoal do meu discurso para vocês. Eu queria agradecê-los... dizer o quanto é importante para mim ter sido escolhido para estar aqui. Vocês foram a primeira turma de alunos que tive quando contratado na UFMG. E ao vê-los nesta formatura, me vêm a mente o quanto os vi mudar, amadurecer, ao mesmo tempo em que este mesmo processo acontecia comigo. Lembro-me de tantas aulas, contatos, conversas, e isso me faz pensar.

Olhemos a nossa volta... Vejamos a sociedade, os políticos, e o que impera? Um capitalismo selvagem e desmesurado; imediatismo, hedonismo, narcisismo. Mais corrupção do que virtude, mais egoísmo do que altruísmo, e uma prodigalidade de maus exemplos que ofuscam e ridicularizam os bons exemplos, que há muito tempo fizeram Rui Barbosa dizer:

“De tanto ver triunfar as nulidades, de tanto ver prosperar a desonra, de tanto ver crescer a injustiça, de tanto ver agigantarem-se os poderes nas mãos dos maus, o homem chega a desanimar da virtude, a rir-se da honra, a ter vergonha de ser honesto. (Senado Federal, RJ. Obras Completas, Rui Barbosa. v. 41, t. 3, 1914, p. 86)”

Mas aí eu lembro de novo que tanto olhei nos olhos de vocês. Onde estão os traços desta sociedade que não vejo?

Thomas Hobbes acreditava que "o homem é o lobo do homem"... Sartre, que "o inferno são os outros". E Rousseau, que o homem nasce essencialmente bom, mas a sociedade o corrompe. Eu vejo em vocês, dezenas de exceções que ao invés de confirmar, desafiam a regra! Vocês ainda não foram corrompidos por estes tecidos sociais perversos, e tenho esperança de que não o sejam. Que sejam diferentes e que façam a diferença! Porque em quatro anos eu vi esforço, mesmo que temperado com angústia... E senti em cada um de vocês uma inevitável, indestrutível, esperança, imune a qualquer momento de descrença.

Sabe-se que num primeiro momento da vida, somos reconhecidos pelo que fazemos... Então façam! Em um segundo momento, o que importa é o que sabemos... Busquem, então, o saber, conscientes de que, como também dizia Guimarães Rosa, "Vivendo se aprende; mas o que se aprende, mais, é só a fazer outras maiores perguntas". Lembrem-se de que, como bibliotecários vocês são os “guardiões da aventura intelectual humana”...


Mas quando chegarem a uma maturidade da qual mesmo eu ainda estou longe, serão reconhecidos pelo que são! Então simplesmente sejam. Plenamente.


Desejo-lhes sucesso. Mas antes e acima de tudo, que sejam felizes.

Obrigado.